O sexo
faz bebés. Daí que seja irónico que a criança, personificação do
amor do casal, ameace tantas vezes o romance que lhe deu existência.
O sexo, que pôs toda essa operação em andamento, é muitas vezes
abandonado assim que os filhos entram em cena. Muitos casais apontam
a chegada do primeiro filho como o início do declínio da sua vida
erótica. Por que motivo desfere a paternidade um golpe tão fatal?
A
transição de dois para três é um dos desafios mais profundos com
que um casal tem de lidar. Precisamos de tempo – e tempo medido em
anos, não em semanas – para encontrar as nossas referências nesse
admirável mundo novo. Ter um bebé é uma revolução psicológica
que altera a nossa relação com quase tudo e quase todos, desde a
amigos, pais e sogros. Os nossos corpos mudam. O mesmo acontece à
nossa vida financeira e profissional. As prioridades alteram-se, os
papéis são redefinidos, e o equilíbrio entre liberdade e
responsabilidade conhece uma extensa reformulação. Apaixonamo-nos
literalmente pelos nossos bebés e sabemos, já que em tempos o
vivemos com os nossos parceiros, que a paixão é um estado
absolutamente absorvente que empurra tudo o resto para segundo plano.
Constituir família exige uma redistribuição de recursos e, durante
uns tempos, parece restar pouco para o casal.
Mais
cedo ou mais tarde a maioria de nós consegue voltar a reconhecer-se
no seio deste novo contexto familiar. É nessa altura que o romance
torna a fazer parte do tecido das nossas vidas. Lembramo-nos que o
sexo é bom; que nos faz sentir bem e nos aproxima.
Enquanto
alguns casais voltam a gravitar para junto um do outro, outros
vagueiam por um caminho de mútuo afastamento. Recuperar a intimidade
erótica nem sempre é fácil. A questão é que os pais de hoje,
independentemente da classe a que pertencem, andam sobrecarregados de
trabalho e sentem-se esmagados sob esse peso. Como consequência,
deixam o sexo para segundo plano nas suas agendas, reservando-o para
quando tiverem terminado de atender a solicitações mais prementes.
Os
casais corajosos e determinados que mantêm uma relação erótica
são, acima de tudo, aqueles que a valorizam. Quando sentem que o
desejo está em crise, tornam-se zelosos e fazem tentativas francas e
diligentes no sentido de o ressuscitar. Sabem que não são as
crianças quem apaga a chama do desejo; são os adultos que deixam de
saber mantê-la viva.
Adaptado
de Perel (2008), “Amor e desejo na relação conjugal”
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