quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Contar histórias ...

        
             Bateram-me no carro! Ficou todo partido! Já viste o meu azar! Tudo me corre mal na vida! Bolas! Cortam-me no ordenado e exigem cada vez mais; chego a casa e lá vem a Maria me chatear, os meus filhos sempre a discutir por tudo e agora mais esta! Estou farto! – contava o João irado ao Manel.
- Olha que sorte João! Se te bateram no carro, o seguro paga e ainda ficas com um carrinho novinho em folha! – retorquiu o Manel.
Ao entrar em casa, João já ouvia os gritos dos dois filhos em luta pelo PC, a Maria berrava ainda mais alto dizendo, “sempre a mesma coisa e o vosso pai nada de aparecer para não variar!”. Por um segundo, João sentiu a irritação invadi-lo e quando estava prestes a gritar “mas que raio se passa desta vez aqui?!” estacou! Respirou profundamente e decidiu chamar a família com a voz mais calma que conseguiu.
- Hoje bateram-me no carro, mas deram-me um carro novinho! E que me dizem a irmos dar um passeio nele? – propôs
Os olhares inicialmente estupefactos de todos deram lugar a sorrisos animados dos filhos que rapidamente anuíram e a uma Maria que, ainda surpresa, pegava com um ar ligeiramente divertido no seu casaco!
Desde sempre e de diferentes formas, o ser humano ouviu e contou histórias. Vivemos tempos, no entanto, em que é preciso restaurar a generosidade do ouvir e ser ouvido, do acolher e do oferecer o bálsamo das histórias. Afinal, conhecer personagens que falem à nossa alma, que nos curem, ou que enfrentem desafios para, no final, serem felizes para sempre, é buscar a construção de um mundo mais leve. A arte de contar histórias é uma viagem que nos transforma, que nos coloca como contadores e ouvintes, como narradores e protagonistas. Por vezes o nosso livro da vida, retrata um mundo pesado onde as personagens são sofredoras nas suas lutas contra as adversidades e nós como qualquer autor saturado da sua narrativa, bloqueámos, não conseguimos escrever novas páginas…páginas diferentes. Damos por nós tentando escrever mais parágrafos, mas ora não conseguimos ou  são quase iguais aos anteriores…
         Qual bloqueio de escritor, ficamos frustrados, perdidos e ansiosos…afinal a “Editora Vida” tem os seus timings e sentimos que o relógio avança e que não continuamos o livro de forma diferente, sentimos que não estamos no caminho para o final desejado.
        Contudo, há que lembrar: somos os autores da nossa história e como tal, a qualquer altura podemos reescrever a nossa história, podemos olhar para as páginas escritas e mudar a sua pontuação, podemos criar novas personagens que ajudem o protagonista ao final desejado, ou fazê-lo encontrar poderes ocultos dentro de si, podemos mudar a nossa narrativa!
        Qual criança nos contos de encantar, temos que acreditar! Acreditar na nossa capacidade de criar, inovar, de olhar de outro ângulo para as situações que se nos apresentam, na nossa capacidade lutar e nos finais que ainda que com entraves, são felizes para nós.
Elisabete Gomes